Um problema persistente: o piolho-do-salmão
A criação intensiva de salmão enfrenta há décadas um dos maiores desafios sanitários da aquicultura marinha: o piolho-do-salmão (Lepeophtheirus salmonis). Além de comprometer o bem-estar dos peixes, esse ectoparasita provoca perdas econômicas significativas e demanda tratamentos constantes. Estima-se que só na Noruega, em 2015, os custos com controle de sea-lice ultrapassaram os 430 milhões de euros (Powell et al., 2017).
Com o tempo, a resistência dos parasitas aos tratamentos químicos reduziu a eficácia dos fármacos. Isso motivou a busca por alternativas mais sustentáveis e economicamente viáveis. A introdução de peixes limpadores — inicialmente do gênero Labrus — foi uma das estratégias adotadas pela indústria. Esses peixes se alimentam dos parasitas diretamente no corpo do salmão. No entanto, sua inatividade em temperaturas abaixo de 6 °C limita seu uso nos meses mais frios.

A ascensão do lumpfish
Nesse contexto, o lumpfish (Cyclopterus lumpus) ganhou protagonismo. Essa espécie, nativa do Atlântico Norte, é capaz de continuar se alimentando de piolhos-do-salmão mesmo em temperaturas próximas a 4 °C. Além disso, seu ciclo de produção é mais curto: enquanto os wrasses levam até 1,5 ano para atingir o tamanho ideal, o lumpfish pode ser preparado em cerca de quatro meses.
Com essas vantagens, a produção da espécie cresceu de forma exponencial. Em 2010, poucos milhares de juvenis eram utilizados. Em 2016, esse número ultrapassou 30 milhões, com previsão de demanda global de até 50 milhões de indivíduos por ano. Noruega e Reino Unido lideraram esse movimento, que passou a ser central no controle biológico de parasitas na salmonicultura em mar aberto.

Sustentabilidade em questão
Apesar do avanço, a produção de lumpfish ainda depende da captura de reprodutores selvagens, o que levanta preocupações sobre a sustentabilidade. A espécie é considerada vulnerável, com registros de declínio populacional em regiões como Canadá, Islândia e Groenlândia. Além disso, há desafios no cultivo: alta mortalidade durante a larvicultura, doenças, dificuldades no controle de reprodução, alimentação inadequada e falta de linhagens geneticamente selecionadas.
A taxa de eficácia na limpeza também é variável. Estudos indicam que cerca de um terço dos lumpfish realmente se alimenta de piolhos após a introdução nas gaiolas. Mesmo assim, eles podem reduzir em até 97% o número de fêmeas adultas do parasita em cultivos experimentais. O comportamento é influenciado por fatores como densidade, tipo de alimentação disponível e estrutura física das gaiolas.

A decisão da Mowi
Em agosto de 2025, a Mowi Scotland anunciou a suspensão da produção e do uso de lumpfish como peixe limpador em suas operações. Segundo a empresa, os resultados obtidos com o uso do peixe não compensaram o investimento, especialmente quando comparados ao desempenho de tecnologias mecânicas mais recentes, como os sistemas de desparasitação por fluxo de água.
A decisão foi comunicada junto à devolução das licenças de cultivo da espécie. Embora a Mowi tenha reafirmado seu compromisso com práticas sustentáveis, incluindo o uso de peixes limpadores, ela indicou que priorizará tecnologias com maior eficácia e previsibilidade. A empresa segue utilizando algumas espécies de wrasses em determinadas áreas, onde os resultados são considerados mais consistentes.

Implicações para a indústria
O abandono do lumpfish por uma das maiores produtoras de salmão do mundo marca um ponto de inflexão. Ele sinaliza que, apesar das vantagens ecológicas e do entusiasmo inicial, a prática ainda enfrenta limitações técnicas, econômicas e biológicas. Essa reavaliação pode estimular novas pesquisas e investimentos em soluções híbridas que aliem biocontrole, genética, automação e engenharia de sistemas de cultivo.
Enquanto isso, permanece o desafio de encontrar abordagens integradas e sustentáveis para lidar com o parasita que continua limitando a expansão da salmonicultura no Atlântico Norte.