Por que importa
Peixes marinhos são majoritariamente refrigerados para consumo. Mesmo a baixas temperaturas, microrganismos persistem, colonizam tecidos após o abate e aceleram mudanças indesejáveis no produto. Falta de protocolos padronizados para isolar e identificar esses micróbios ainda trava o progresso científico.

Importante distinguir
O estudo aborda peixes marinhos refrigerados (armazenados em gelo ou câmaras frias, entre 0 e 4 °C). Nessa condição, as bactérias ainda conseguem crescer lentamente, provocando perdas de qualidade. Isso é diferente de pescado congelado (abaixo de –18 °C), no qual o crescimento microbiano praticamente cessa e os mecanismos de deterioração são outros.

Quem estraga e como
O levantamento descreve vias de deterioração que formam odores e compostos tóxicos. Aminas biogênicas, como histamina, cadaverina e putrescina, podem se acumular durante o armazenamento. Geração de sulfeto de hidrogênio também preocupa.
Três gêneros aparecem com frequência em diferentes espécies e países: Pseudomonas, Shewanella e Photobacterium. A predominância varia conforme temperatura, embalagem e origem do pescado, com casos documentados em salmão, bacalhau e atuns.

Variações regionais exigem olhar local
A composição das comunidades microbianas muda com área de captura, transporte e interrupções da cadeia fria. Estudos com sequenciamento reforçam que “super-resfriamento” desacelera a sucessão microbiana e que fatores geográficos e sazonais moldam a microbiota do peixe.
Ferramentas: do laboratório ao modelo
A revisão propõe integrar ômicas e análise de riscos. Ômicas são plataformas que leem moléculas do sistema biológico: genômica (DNA), transcriptômica (RNA), proteômica (proteínas) e metabolômica (metabólitos). Essa leitura conecta micróbios, genes e compostos que marcam a deterioração e ajuda a prever o risco.
Sensores fluorescentes, técnicas rápidas e não destrutivas, ganham espaço e, combinados com ômicas e inteligência artificial, qualificam a avaliação da qualidade em tempo real.
QMRA com IA: o que muda
O estudo posiciona a Avaliação Quantitativa de Risco Microbiológico (QMRA) como eixo para previsão de risco e vida de prateleira. Com dados de crescimento microbiano e marcadores voláteis, modelos aprendem padrões e simulam cenários fora do laboratório. A agenda inclui melhor coleta de dados, modelagem e análise de incerteza.
Arquiteturas de aprendizado profundo, visão computacional e IA explicável já classificam frescor, rastreiam mudanças na comunidade microbiana e identificam alvos químicos ligados à deterioração. Esses sistemas podem converter sinais de sensores em alertas práticos para a cadeia do peixe.

Gargalos e próximos passos
Faltam estudos comparativos entre regiões, padronização de métricas e amostragens mais robustas. A revisão defende compartilhamento de dados e colaboração interdisciplinar para um framework eficaz, sustentado por IA e grandes bases.
Prioridades destacadas: ligar melhor comunidades nativas do ambiente às que surgem no frio; diferenciar com precisão o que é deterioração endógena do peixe e o que é microbiana; e validar modelos preditivos para uso prático na cadeia fria.
Em uma frase
O recado central é claro: reduzir perdas e garantir segurança passa por reconhecer os micróbios do frio, medir seus sinais com ômicas e sensores, e transformar tudo em decisão com QMRA apoiada por IA.