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    Aquicultura ornamental marinha: pode ser sustentável e se aliar à conservação?

    Primeiramente gostaria de dizer que me sinto honrada em fazer parte desse time de peso dos colunistas da Aquaculture Brasil, e confesso que pensei muito no que abordar na minha primeira coluna.Apesar de não ser um assunto novo, não pude deixar de trazer à tona esse tema. No atual momento em que vivemos, fica cada vez mais gritante que não temos como pensar na aquicultura desvinculada da sustentabilidade, tanto social e econômica, mas principalmente ambiental. Isso se mostra evidente no ambiente terrestre, onde a tempos devíamos seriamente repensar a forma com que fazemos agricultura. A ocupação de grandes áreas de forma desordenada, o desmatamento causado de forma direta ou indireta pela atividade agropecuária, ligado muitas vezes a queimadas e em áreas protegidas, a poluição entre outros fatores, resultam em um desequilíbrio ambiental talvez irreversível para a manutenção da produtividade rural e qualidade de vida. Segundo um estudo da revista Science (2022), estima-se que, apenas entre 45-65% das áreas desmatadas pela agricultura tornam-se produtivas. Isso somado às mudanças climáticas, torna o problema ainda mais sério e complexo.

    Muitas perguntas vêm à tona…. Até quando conseguiremos manter a produção agrícola nestas condições? O quão próximo estamos do ponto de não retorno ambiental? Afinal, dependemos de um solo fértil e conservado, de temperaturas adequadas para o plantio, do ciclo natural de chuvas, da biodiversidade e do uso de técnicas apropriadas para a produtividade perene e para a saúde ambiental.

    Na aquicultura isso não é diferente. A forma com que usamos os recursos ambientais bem como os organismos produzidos reflete na segurança produtiva, ambiental e social.

    Nesse sentido, a criação de organismos ornamentais marinhos, com ênfase nos peixes, pode se mostrar como uma atividade sustentável, cruzando de maneira significativa com os esforços de conservação, indo muito além de produzir organismos com fins somente de ornamentação. Normalmente para a sua criação utiliza-se áreas menores (verticalização estrutural), sistemas de recirculação de água (RAS), especialmente em locais distantes da costa, conservando a água e protegendo os ecossistemas aquáticos, além de minimizar o escape dos animais cultivados. Complementamente, a aquicultura ornamental marinha pode proporcionar meios de subsistência para comunidades locais, reduzindo a dependência de práticas de pesca destrutivas.

    Pode também ser uma ferramenta para reduzir a pressão sobre as populações selvagens, sendo assim uma fonte alternativa para o mercado para espécies populares, ou mesmo criando espécies ameaçadas, o que pode auxiliar nos esforços de recuperação e conservação desses organismos.

    Sabe-se que, o futuro da indústria da aquariofilia depende, em parte, da transição para a obtenção sustentável de organismos ornamentais. Assim, a aquicultura ornamental marinha pode ser uma alternativa sustentável à coleta da natureza. Em alguns casos, peixes produzidos em cativeiro, por exemplo, podem atender à demanda comercial por uma espécie, diminuindo ou mesmo eliminando a necessidade da coleta de populações selvagens.

    O cardinal banggai Pterapogon kauderni é um exemplo. Endêmico do Arquipélago de Banggai, Indonésia, este peixe sofreu uma drástica diminuição da sua população natural sendo incluído como ameaçado na Lista Vermelha da International Union for Conservation of Nature (IUCN) devido a coleta excessiva para o comércio de peixes ornamentais, a perda e a degradação ambiental. Tornou-se popular nos aquários do mundo sendo que sua coleta teve pico em 2008, quando estimou-se que aproximadamente 150 mil peixes selvagens foram importados pelos Estados Unidos. Através da aquicultura, em 2013, aproximadamente 120 mil banggais foram produzidos e importados pelo mesmo país. Assim, apesar da captura de selvagens ainda ocorrer, a redução significativa da sua coleta pôde dar uma oportunidade para a recuperação e restauração das populações naturais.

    Talvez pudéssemos pensar que seria mais fácil se não tivéssemos organismos ornamentais em cativeiro, entretanto, querendo ou não, a indústria da aquariofilia é uma realidade e que movimenta bilhões de dólares, envolvendo diversos países.

    Assim, a aquicultura ornamental marinha apresenta tanto desafios quanto oportunidades para a conservação. Quando praticada de maneira sustentável, pode contribuir para a proteção de ecossistemas aquáticos e a promoção da biodiversidade, ao mesmo tempo que pode envolver comunidades na importância de preservar os recursos naturais. Equilibrar interesses econômicos com objetivos de conservação é fundamental para maximizar o impacto positivo da aquicultura ornamental marinha.

    Nas próximas colunas, vamos discutir um pouco mais algumas problemáticas e propor alguns caminhos para que esta atividade possa efetivamente compor uma importante ferramenta de conservação.

    Referências Bibliográficas:

    Pendrill et al. (2022). Disentangling the numbers behind agriculture-driven tropical deforestation. Science, Vol. 377, No. 6611.

    Rising Tide Conservation. (2019). Banggai cardinafish, Pterapogon kauderni, Aquaculture Pledge. (http://www.risingtideconservation.org/banggai-cardinalfish/. Acesso em 20 out 2024).

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