Mas confronto e conflito não é a mesma coisa? E o que isto tem a ver com a produção comercial de peixes, camarões e a pesca?
Calma, é preciso muito consenso nisto tudo!
Primeiro é necessário contextualizar! É notório o desenvolvimento econômico e progresso da humanidade nos últimos 50 anos. A expansão da produção de bens e serviços, aumento da oferta de alimentos (e consequente diminuição dos preços), contribuiu para melhoria significativa na qualidade de vida de bilhões de pessoas. Também é notório a redução dos níveis de pobreza, melhoria dos indicadores de saúde, educação e bem-estar por conta deste progresso. São avanços incontestáveis. Ponto final!
Contudo, especialmente nos últimos 10 anos, tem sido cada vez mais recorrentes confrontos vindos de variadas formas onde questionam a real conciliação entre desenvolvimento econômico, bem-estar social e sustentabilidade ambiental. O que era pra ser um “tripé”, virou um “trilema”! Aliás, do ponto de vista ambiental, será que realmente são dilemas ou há exageros (por conta de interesses obscuros) em tais questionamentos?
Diferença entre confronto e conflito
Independente de ser ou não um dilema, o fato é que o setor de proteína aquática precisa se preparar melhor para impor consenso. Agora sim, trazendo luz a diferença entre confronto X conflito, cabe destacar que conflitos envolvem divergências consideradas naturais, positivas e úteis. Conflitos são bons, são necessários e saudáveis. O que não é saudável, pra ambas as partes inclusive, é ter sempre o pensamento de derrotar o oponente quando estamos diante de impasses e divergências.
Por outro lado, confronto é péssimo! Confronto é a guerra declarada, é a ideia de triunfar um argumento com a eliminação do questionador, no caso, adversário. É aquela situação que um tem que sair morto, sendo que por vezes, ambos saem mortos. Isto não soma, não agrega… tem que ser evitado.
Em resumo: Conflito é quando duas partes se debatem procurando uma solução, confronto é quando um quer anular o outro. Conflito gera evolução, confronto guerra. A paz não é a ausência de conflitos, a paz é a ausência de confrontos.
Consenso, o verdadeiro herói!
E é justamente aí que o consenso se apresenta, o qual vem com a missão de impedir que os conflitos se transformem em confrontos. E isto se consegue através de uma discussão em bom nível, onde todos oferecem seus conhecimentos, experiências e percepções em prol da melhor decisão.
Entretanto, na prática, o que mais se observa é a falta de consenso dentro do segmento de proteína aquática, implicando em confrontos rotineiros. E o agravante: como se não bastasse os confrontos externos, ainda criamos confrontos internos, como por exemplo a aquicultura se digladiar com a pesca comercial e vice-versa. Por falta de consenso, o conflito não é gerado e ambos saem dilacerados. Mas isto é só um exemplo, já que o ponto focal desta abordagem são questões externas. Haja visto as recentes polêmicas envolvendo o possível estabelecimento da tilápia no mar e que bacon é melhor que tilápia.
Postura diante de possíveis confrontos
Mesmo que o oponente se declare, se apresente com a intenção de confrontar, cabe a nós mostrar o consenso e tentar encaminhar para o conflito. Aí que vem a importância do setor entender o seguinte: existe uma pré-disposição para o confronto entre urbanos X produtores de alimentos, onde os urbanos colocam nós produtores de proteínas aquática no mesmo grupo de todos os produtores de alimentos, especialmente na figura imaginária deles do tal “fazendeiro”.
Até aí tudo bem. No entanto, o problema é forma como enxergam o fazendeiro. Para aqueles que não conhecem o Agro, especialmente os que nunca pisaram em uma unidade produtiva de alimentos (e é justamente este grupo que mais gosta de dar pitacos, de correlacionar coisas cabulosas), fazendeiro é a melhor profissão do mundo: tudo caí do céu pra este profissional. Somente quem vive ou depende do campo sabe que não é bem assim.
Parte massiva dos urbanos, que por falta de um entendimento básico, consideram a agricultura um negócio bom e necessário, mas o agronegócio é o câncer do Brasil. Quando na verdade, agricultura é o que acontece dentro da porteira e agronegócio tudo o que acontece antes e depois da porteira. Um não vive sem o outro. São pessoas com tendência a enxergarem problemas onde existem oportunidades!
Algo como se eles, os urbanos, fossem os mocinhos e nós, ruralistas, os bandidos. Nós e nossos pais e avós com raízes no campo. Isto é injusto e inaceitável.
Perfil do oponente
Aí sim, tendo o setor de proteína aquática este entendimento do perfil de pessoas que atacam o agro como um todo, é que devemos nos posicionar de forma inteligente, apresentando o consenso com a intenção de levarmos para o conflito aquilo que se apresentou de forma declarada com a intenção de confronto. Detalhe: é um perfil de público que se perder esta guerra, não estão perdendo nada, pois, não é este o negócio deles. Estão ali só pra confrontar mesmo, não tem nada a perder. Tá vendo o quanto é desinteligente entrar em confronto?
Ou seja, o campo precisa se aproximar da cidade. Sem pedras na mão! Temos argumentos de sobra e precisamos mostrar que também temos consenso. Em tempo, não basta somente ter consenso! É fundamental entrar com o consenso do jeito certo, de forma educada, com respeito, com elegância. Se tiver o entendimento da importância do consenso, mas entrar com “sangue no zóio” pronto, já virou confronto. Até por que, por mais virtudes que tenhamos, também temos nossos “telhados de vidro”. Por fim, o setor de proteína aquática terá um avanço expressivo se transformar os confrontos internos em conflitos. Que tal usarmos de mais consenso e pouparmos energia pra cuidar só do que vem de fora?
Dr. Fábio Sussel – Pesquisador Científico do Instituto de Pesca de SP – [email protected]
